O fórcipe, utilizado na prática obstétrica desde a Antiguidade, continua tendo lugar de destaque na obstetrícia moderna. Quando bem utilizado é instrumento valioso, colaborando de forma efetiva e importante na realização do parto vaginal. Infelizmente, o estigma negativo que lhe foi imputado pelas antigas práticas obstétricas persiste entre os leigos e entre aqueles que não foram adequadamente treinados para seu uso.
Hoje, encontram-se afastadas da prática obstétrica as aplicações de fórcipe em cabeças altas ou encravadas no estreito médio do canal do parto (contraindicação absoluta). O fórcipe baixo, no entanto, é mais requerido atualmente que há 40 anos, diante da comprovada eficácia em evitar a hipóxia fetal, abreviando o período expulsivo e minimizando os riscos de sequelas neurológicas.
Tem como principais funções a apreensão, tração, ocasionalmente rotação do pólo cefálico fetal e correção de assinclitismos. Varia consideravelmente em forma e tamanho, mas basicamente é constituído de dois ramos que se articulam após serem introduzidos seqüencialmente na vagina, de acordo com a posição do pólo cefálico. Cada ramo é constituído por colher, cabo, haste e articulação e tem duas curvaturas, a cefálica que abrigará a cabeça fetal, e a pélvica que se relaciona com o canal de parto.
Nos fórcipes cruzados, que após articulados ficam em forma de X, a mão direita segurará o ramo direito que, depois de aplicado, ocupará o quadrante direito da bacia materna. Por outro lado, a mão esquerda empunhará o ramo esquerdo, que se locará no quadrante esquerdo da bacia materna. A concavidade da colher de cada ramo se defronta e se opõe, sendo que suas extremidades jamais se encontram, amenizando a compressão exercida sobre a cabeça fetal.
Principais fórcipes atualmente utilizados:
1. Fórcipe de Simpson-Braun
Características: Articulação fixa por encaixe. Acentuada curvatura pélvica.
Utilização: nos fetos com sutura sagital no diâmetro anteroposterior ou nas variedades de posição anterior e posterior, sem bossa importante.
2. Fórcipe de Kielland
Características: Articulação móvel, com deslize do ramo direito sobre o esquerdo.
Curvatura pélvica discreta.
Utilização: pode ser aplicado em todas as condições (variedades oblíquas, diretas ou transversas). É preferível para ser aplicado nas posições transversas e nas anteriores e posteriores com bossa serosanguinolenta significativa, uma vez que permite uma pega que possibilita a correção do assinclitismo (articulação móvel).
Pela quase inexistência de curvatura pélvica, é instrumento rotador por excelência.
3. Fórcipe de Piper
Características: Articulação fixa por encaixe. Curvatura perineal acentuada.
Curvaturas cefálicas e pélvicas pouco pronunciadas, promovendo discreta solicitação do assoalho perineal no momento da tração.
Utilização: No parto pélvico com dificuldade de desprendimento do pólo cefálico derradeiro. A cabeça precisa, obrigatoriamente, estar insinuada. Na indisponibilidade deste instrumento, o fórcipe de Kielland ou de Simpsom poderá substituí-lo, dependendo da preferência e treinamento do parteiro.
Classificação do fórcipe em relação à altura da apresentação
1. Fórcipe de alívio
• Cabeça visível no intróito vaginal, sem necessidade de separação manual dos grandes lábios,
• Cabeça rechaçando o assoalho pélvico,
• Sutura sagital no diâmetro anteroposterior (occipito púbico ou occipito sacro) ou nas variedades de posição occipito direita ou esquerda anteriores (ODA ou OEA),
• Rotação da cabeça fetal não excede 45°.
2. Fórcipe baixo
• Cabeça fetal pelo menos no plano +2 de De Lee / entre III e IV de Hodge sem, no entanto, alcançar o assoalho pélvico, com:
• Rotação <_ 45° (variedade de posição occipito esquerda ou direita anterior rodando para occipito púbico ou variedade de posição occipito esquerda ou direita posterior rodando para occipito sacro),
• Rotação maior que 45º (variedade de posição occipito transversa, occipito esquerda ou direita posterior rodando para occipito púbico).
3. Fórcipe médio
• Quando a aplicação do fórcipe faz-se em cabeça cujo vértice está acima do plano +2 de De Lee / III de Hodge, com pólo cefálico insinuado. É conveniente e ideal o parecer de outro obstetra devido aos riscos inerentes à sua aplicação. Na prática obstétrica atual é procedimento de exceção.
A utilização do fórcipe torna-se justificável em casos que ameacem o bem estar materno e/ou fetal e que possam ser revertidos ou melhorados pelo uso adequado e seguro do instrumento.
Algumas indicações maternas incluem a doença cardíaca, doença pulmonar grave, infecção intraparto, certas condições neurológicas, eclampsia e síndrome HELLP. Indica-se, também, no período expulsivo prolongado, seja por exaustão materna, por inércia ou hipoatividade uterina ou, ainda, por incapacidade de utilizar adequadamente a prensa abdominal, como pode ocorrer após analgesia peridural ou quando a mãe é portadora de uma grande hérnia abdominal.
Nas portadoras de cicatrizes uterinas prévias, especialmente cesáreas, em virtude do risco iminente de rotura do útero, costuma-se abreviar o período expulsivo com o uso profilático do fórcipe.
As indicações fetais incluem o prolapso de cordão umbilical, o sofrimento fetal agudo e a cabeça derradeira insinuada no parto pélvico. Para minimizar os supostos riscos da utilização do fórcipe, torna-se imprescindível que alguns prérequisitos sejam obrigatoriamente seguidos.
O mais importante deles é a boa qualificação do obstetra. Na indicação e na realização do procedimento, para que o aparelho seja adequadamente aplicado, necessita-se:
1. Concepta viva ou com morte recente
2. Anestesia materna
3. Bexiga vazia
4. Colo com dilatação completa
5. Membranas ovulares rotas
6. Diagnóstico correto da variedade de posição (OP, OEA, ODP, etc.).
7. Proporcionalidade adequada entre o feto e a pelve materna
8. Apresentação pelo menos no plano +2 de De Lee / entre III e IV de Hodge (preferencialmente no plano +3 de De Lee / IV de Hodge, na atualidade a grande indicação de aplicação do aparelho)
9. Episiotomia (preferencialmente médio-lateral)
Embora o bloqueio pudendo possa ser adequado para o fórcipe de alívio, a anestesia regional, peridural ou raque, é usualmente requerida nos fórcipes baixos ou médios e quando há dificuldade de interpretação da variedade de posição fetal, especialmente na presença de bossa serosanguínea volumosa. Em poucas oportunidades é necessário utilizar a anestesia geral.
Pega Ideal (Biparietomalomentoniana)
Fonte: Portal da Educação