PCR na Gravidez

A PCR que ocorre durante a gravidez é, sem dúvida, um dos eventos mais dramáticos que envolvem os atendimentos de emergência, considerando o envolvimento de duas vidas nesta condição, sem a melhor expectativa de vida ao feto ofertada exatamente pela melhor condição de sobrevivência da mãe.

A frequência de PCR na gravidez é 1:30.0001088. A despeito da maioria das mulheres grávidas que sofre PCR, as taxas de sobrevivência são bastante baixas, em torno de 6.9%.

As recomendações primordiais para o atendimento em condições emergenciais em grávidas são:


• Posicionar a grávida em decúbito lateral esquerdo, objetivando a descompressão da veia cava inferior. O aumento do útero promove a redução do retorno venoso por compressão venosa e precipita hipotensão e hipovolemia relativa, com redução da pré-carga funcional, motivando a PCR. É fundamental atentar à condição de hipotensão prévia da mãe definida como pressão arterial sistólica inferior a 100mmHg ou 80% da pressão arterial basal.

• Ofertar o máximo de fração inspirada de oxigênio possível (preferencialmente 100%).

• Estabeleça um acesso IV acima do diafragma. Não há nenhum ensaio clínico aleatorizado que compare tratamentos distintos para RCP em grávidas. Portanto, as recomendações existentes na literatura se baseiam nos aspectos fisiopatológicos e descrições da literatura.

Durante a RCP em grávidas, a imediata associação com a necessidade de posicionamento da vítima em decúbito lateral promove a melhora da condição volêmica, débito cardíaco e fração de ejeção, além de melhorar a oxigenação e frequência cardíaca fetal.

A dificuldade maior está em manter a efetividade de compressões, considerando a posição em decúbito lateral. Angulações do decúbito de pequena ordem, em torno de 10° a 20° não ofereceram melhora hemodinâmica à mãe ou feto, em situações fora da PCR. Estudos clínicos relatando o deslocamento uterino feito de forma manual, com o paciente em posição supina, demonstraram ser esta manobra semelhante ou até melhor que o decúbito lateral para a descompressão da aortocava.

Assim, o deslocamento manual, durante a manobra de RCP na grávida, torna-se mais viável e adequado que o decúbito lateral esquerdo, sendo esta manobra realizada com duas mãos tracionando o útero para a esquerda ou uma mão com o socorrista posicionado à direita, empurrando o útero para a esquerda. Se tal técnica se demonstra ineficiente, deve-se posicionar a paciente em decúbito lateral de 27° a 30°, utilizando um coxim que possa suportar esta posição para a pélvis e tórax.

Fonte: Adaptado da American Heart Association

Ventilação


Pacientes grávidas podem desenvolver hipoxemia rapidamente, com redução da capacidade funcional e aumento da demanda de oxigênio, com taxas de shunt intrapulmonar de até 15% comparadas ao estado não gravídico, que estas taxas mal chegam a 5%, particularmente devido à elevação do diafragma.

Em pacientes grávidas, também, são comuns alterações da anatomia da via aérea, com edema, friabilidade de mucosa, hipersecreção e hiperemia, tornando as vias aéreas superiores mais estreitas, particularmente, no primeiro trimestre de gestação e oferecendo maior risco de aspiração e desaturação. O uso de bolsa-valva-máscara também oferece menor eficiência, e deve ser usada sempre com oxigênio em 100%, bem como os procedimentos de intubação orotraqueal que, por vezes, são feitos com maior dificuldade, sendo relevante disponibilizar o acesso a dispositivos supraglóticos.

 Circulação


As compressões torácicas devem ser realizadas em região do esterno um pouco mais alta que a posição habitual, normalmente recomendada, considerando o ajuste do conteúdo torácico, a elevação diafragmática e aumento do volume abdominal devido ao útero gravídico.
A despeito do aumento da taxa de filtração glomerular e volume plasmático descrito na gravidez, não há evidência que justifique a necessidade de ajuste de doses de fármacos usados durante a RCP.

A desfibrilação deve ser executada em prioridade seguindo as recomendações habituais de seu uso. Não sendo descrito nenhum dano à mãe ou feto, a despeito de relatos de casos correlacionando a lesão fetal quando acidentes com corrente continua ou alternada atingiram a mãe. O risco maior associado a evento adverso inclui a passagem de corrente pelo útero e líquido amniótico, que se constitui em adequado meio condutor. Todavia tanto a cardioversão como a desfibrilação oferecem baixo risco para lesão fetal e são considerados procedimentos seguros a todos os estágios da gestação, sendo recomendada apenas a retirada de monitores fetais internos ou externos acoplados à mãe durante a realização do procedimento.

Causas da PCR em gestantes


As causas mais comuns de PCR em mulheres durante a gravidez são de origem cardíaca (infarto agudo do miocárdio e dissecção de aorta). Em território americano, o risco associado ao IAM é de três a quatro vezes maior durante o período de gravidez.

A toxicidade pelo uso de magnésio pode promover aumento do espaço PR e QT e alargamento do QRS com níveis de 2.5–5mmol/L e chegar até bloqueios atrioventriculares, bradicardia, hipotensão e PCR em níveis até 6–10mmol/L. A administração empírica de cálcio é o antídoto para esta condição.

A pré-eclampsia e eclampsia desenvolvem-se após a vigésima semana de gestação e podem produzir grave hipertensão e disfunção de múltiplos órgãos e sistemas, com elevada mortalidade materno-fetal.

O tromboembolismo pulmonar é causa comum de PCR em grávidas e deve ser tratado com as recomendações normais de tratamento à PCR nesta condição. A embolia por líquido amniótico tem sido abordada com sucesso utilizando circulação extracorpórea e cesárea imediata.

Para os cuidados pós-PCR, há documentação pequena da segurança de hipotermia recomendando-se, quando utilizada, a monitoração fetal intensa.

A PCR materna não revertida imediatamente com suporte básico e avançado de vida decorre de influência relevante da compressão aortocava. Esta ocorre habitualmente por volta da vigésima semana de gestação, mas pode diferir em tempo, especialmente em multíparas, retardo do crescimento intrauterino e múltiplos fetos. Habitualmente, quando o fundo uterino ultrapassa o nível da cicatriz umbilical, poderá ocorrer a compressão aortocava e a necessidade de cesariana pode ser imperiosa, independente da idade gestacional.

Relatos da literatura demonstram que, após a realização do parto cesáreo, ocorreu melhora da condição hemodinâmica materna e RCE. O tempo restrito de 5 minutos para resposta às manobras de SBV e SAVC foi descrito, inicialmente, em 1986 e continuado, desde então, sistematicamente, em diretrizes e consensos, porém não se faz necessário que a equipe que atende a PCR aguarde rigidamente este tempo, podendo, dependendo da condição ou circunstância, realizar o procedimento de forma mais precoce, particularmente, quando o prognóstico materno é mais reservado e os esforços de RCP seriam fúteis, sendo então relevante a atenção à viabilidade fetal. Entre 24 e 25 semanas, as taxas de sobrevivência do bebê são maiores se o parto é realizado antes de 5 minutos de PCR; a partir de 30 semanas, esse tempo pode exceder 5 minutos.

Assim, a ativação do grupo que irá realizar a cesária deve ser imediata, tão logo ocorra a PCR, para que a cesárea seja considerada, caso em até 4 minutos não ocorra a RCE.

Fonte

I Diretriz de Ressuscitação Cardiopulmonar e Cuidados Cardiovasculares de Emergência da Sociedade Brasileira de Cardiologia - 2013

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