Distonia é uma disfunção neurológica caracterizada
pela contração involuntária e sustentada de um músculo isolado ou de um grupo
muscular, podendo ser primária (idiopática) ou secundária a outras doenças. As
distonias podem causar movimentos e posturas anormais, que podem ser
incapacitantes e, frequentemente, dolorosos. Entretanto, nem toda contração
muscular involuntária constitui uma distonia.
Cãibras, tremor, espasticidade
e outros movimentos involuntários, como coreia, não são considerados distonias.
A incidência das formas
focais é estimada em 2 novos casos por milhão de habitantes por ano, resultando
em uma prevalência de 29,5 casos por 100.000 habitantes. Estas taxas são
maiores do que as de outras doenças neurológicas bem conhecidas, tais como
doença do neurônio motor, miastenia gravis ou doença de Huntington.
As distonias, grupo heterogêneo de desordens, podem ser assim
classificadas:
• pela idade de início
(precoces e tardias);
• pela etiologia (primárias
ou secundárias);
• pela distribuição
corporal do comprometimento.
De acordo com a distribuição corporal, as distonias podem ser classificadas em:
• focais, envolvendo
músculos de uma região limitada do corpo (por exemplo, a face);
• segmentares, envolvendo
grupos musculares contíguos (por exemplo, membro superior e ombro);
• hemidistônicas, afetando
os membros do mesmo lado do corpo;
• multifocais, envolvendo
segmentos corporais não contíguos;
• generalizadas, envolvendo
uma perna e o tronco ou ambas as pernas e qualquer outro segmento do corpo.
O tratamento das distonias é essencialmente sintomático e se baseia
no alívio das contrações musculares, revertendo os movimentos e as posturas
anormais e a dor associada e prevenindo contraturas e deformidades. A toxina
botulínica tipo A (TBA) representa uma opção terapêutica reconhecida, sendo considerada
o tratamento de escolha para a maioria das distonias focais e segmentares.
Classificação e statística internacional de doenças e problemas relacionados à saúde (CID -10)
• G24.0 Distonia induzida
por drogas
• G24.1 Distonia familiar
idiopática
• G24.2 Distonia não
familiar idiopática
• G24.3 Torcicolo
espasmódico
• G24.4 Distonia orofacial
idiopática
• G24.5 Blefaroespasmo
• G24.8 Outras distonias
• G51.8 Espasmo hemifacial
Diagnóstico
As distonias focais têm
diagnóstico sindrômico, baseado, portanto, nos achados clínicos, não havendo exames
laboratoriais ou de imagem específicos. Podem ser manifestações de outras doenças
neurológicas, sendo a identificação de possíveis causas secundárias uma rotina
na assistência aos pacientes. As características clínicas que constituem os
critérios diagnósticos para as distonias focais passíveis de tratamento com TB
estão descritas abaixo.
Distonias Craniofaciais e Espasmo Hemifacial
Blefaroespasmo
Blefaroespasmo é a
contração espasmódica involuntária e bilateral do músculo orbicular dos olhos
que causa fechamento ocular forçado, intermitente ou sustentado. Contrações da
musculatura frontal e músculos médios e inferiores da face podem ocorrer
concomitantemente na chamada síndrome de Meige. Os primeiros sintomas costumam
ser sensação de irritação ocular ou hipersensibilidade à luz, ocasionando
aumento da frequência do piscamento, cuja intensidade aumenta gradualmente até
tornar-se uma contratura espasmódica, dificultando a abertura ocular. Em alguns
casos, pode haver grande prejuízo de visão (cegueira funcional) devido aos
espasmos, sendo necessária ajuda para a realização das atividades habituais.
Espasmo hemifacial
Espasmo hemifacial é um dos
mais comuns distúrbios do movimento craniofacial e consiste em movimentos
involuntários tônicos ou clônicos, irregulares, dos músculos de um só lado da
face (orbicular dos olhos, frontal, risório, zigomático maior), além do
platisma. O espasmo hemifacial caracteriza-se por espasmos musculares
frequentemente associados à compressão do nervo facial por estruturas
vasculares na saída do tronco cerebral.
Distonia oromandibular
Distonia oromandibular caracteriza-se
por contrações espasmódicas da musculatura mastigatória (temporal e masseter),
facial inferior (orbicular da boca, complexo submentoniano, pterigóideos
lateral e medial), lingual, labial e, esporadicamente, cervical (platisma). Os
espasmos causam dificuldade para abrir ou fechar a boca devido ao desvio
lateral da mandíbula, trismo ou bruxismo e desvio lateral ou superior ou
protrusão da língua. Desta forma, dificultam a mastigação, a deglutição e a
articulação das palavras e causam limitação funcional e embaraço social para
muitos pacientes.
Distonia Laríngea ou Disfonia Espasmódica
Distonia laríngea é uma forma de distonia focal que
compromete os músculos da prega vocal, da laringe e da faringe envolvidos no
processo de vocalização, podendo estar associada à distonia de outros músculos faciais.
Existem duas formas de distonia laríngea: adutora
e abdutora.
Na distonia adutora, ocorre adução exagerada e irregular da prega
vocal, que determina um padrão de voz cansado, com timbre metálico, áspero,
tensoestrangulado, do tipo sufocado, com início e término abruptos (voz
entrecortada), devido a quebras curtas na fonação. A fala tem redução da maciez
e se torna menos compreensível, embora o canto seja usualmente menos afetado do
que a fala propriamente dita, exceto nos casos severos.
Na distonia abdutora (forma menos frequente), ocorre contração
sustentada dos músculos cricoaritenóideos posteriores, com abdução exagerada da
prega vocal. A voz fica reduzida em volume, assoprada ou sussurrada, resultando
em segmentos afônicos e dificultando a compreensão.
Distonia Cervical ou Torcicolo Espasmódico
Distonia cervical é o tipo mais comum de distonia
focal. Caracteriza-se por contração involuntária de músculos da região
cervical, de forma assimétrica, ocasionando alterações da postura cefálica,
tais como desvio lateral, para frente, para trás, rotação ou ainda uma
combinação destes movimentos. Além disso, é comum a variação na intensidade dos
espasmos, que costumam piorar durante períodos de estresse e de cansaço e
melhorar com o repouso ou quando em decúbito dorsal. Dor é uma manifestação
comum das distonias cervicais, estando presente em cerca de dois terços dos pacientes.
A distonia cervical classifica-se em:
• tipo I - cabeça rotada para um lado com elevação do ombro
ipsilateral;
• tipo II - cabeça rotada para um lado;
• tipo III - cabeça inclinada para um lado com elevação do ombro
ipsilateral;
• tipo IV - cabeça inclinada para trás.
Distonia de Membro
Neste tipo de distonia
focal, também conhecido como cãibra do
escrivão, ocupacional ou de tarefa, ocorre uma excessiva contração
simultânea de músculos antagonistas do antebraço apenas durante um ato
específico, em geral o de escrever. Normalmente, costuma permanecer restrita ao
membro que está sendo utilizado, afetando mais frequentemente o grupo de
músculos flexores do antebraço, mas o compartimento extensor também pode estar
envolvido. Evolução do quadro pode ocorrer, com as contrações musculares sendo
desencadeadas pela realização de outros movimentos ou surgindo mesmo durante o
repouso. É possível que este distúrbio seja consequência da atividade repetitiva
do membro em indivíduos geneticamente predispostos.
Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas - Série A. Normas e
Manuais Técnicos - MINISTÉRIO DA SAÚDE